Leão          ~ Santo Inácio ~: Zygmunt Bauman

segunda-feira, 23 de maio de 2011

Zygmunt Bauman

Zygmunt Bauman, o pensador da globalização individualizada











Tudo isto a propósito da tradução para português de Portugal (para o Brasil já fora traduzido há séculos, por Jorge Zahar Editor, vd. artigo analítico de Daniel Soczek aqui) dum dos últimos livros do sociólogo polaco Zygmunt Bauman (n.1925), um dos grandes pensadores actuais das vivências sociais sob a globalização e, em particular, das consequências das representações sobre a convivência urbana. O medo social como escapatória para o interelacionamento social, o individualismo como único refúgio, é uma das teses principais da sua obra seminal, Modernidade líquida, or. 2000, Polity Press.
É um post pertinente, não só pela síntese divulgativa que faz mas, sobretudo, pelo sentido de oportunidade que almejou, ao remeter para as implicações sociais das opções políticas em matéria de Segurança social.
Vale a pena atentar nas ressonâncias plurais, mais do que proféticas, do
pensamento de Bauman, como nesta passagem em que retoma Herbert Sebastian Agar (A time for greatness, 1942): "«a verdade que torna os homens livres é, na maioria dos casos, a verdade que os homens preferem não ouvir»" (Modernidade líquida, Rio, Zahar Ed., 2001, p. 26). Indo mais além, Bauman interroga-se sobre os benefícios da liberdade, revendo toda uma galeria de autores até chegar a Émile Durkheim e à sua "filosofia social compreensiva": "«O indivíduo se submete à sociedade e essa submissão é a condição de sua libertação. Para o homem a liberdade consiste em não estar sujeito às forças físicas cegas; ele chega a isso opondo-lhes a grande e inteligente força da sociedade, sob cuja proteção se abriga. Ao colocar-se sob as asas da sociedade, ele se torna, até certo ponto, dependente dela. Mas é uma dependência libertadora; não há nisso contradição»" (ibidem, p. 27).









Questões









  1. O que são inquietações existenciais?






  2. Qual o paradigma de certeza na sociedade moderna?






  3. O que justifica a descartabilidade na sociedade moderna?






  4. Somos modernos ou semi-modernos?






  5. Pontos que solucionam o capitalismo nos dias atuais.






Respostas













  1. A grande arte, aquela não contaminada pelo mercantilismo ou por personalidades pueris, pequenas, expõe de forma profunda os pensamentos, sentimentos e inquietações sobre a nossa existência. Por este motivo, penso eu, a Psicologia deve estar atenta à arte, pois assim captará os movimentos, dramas e reflexões sobre nossa sociedade contemporânea.






  2. Na caracterização do mundo moderno como "sociedade do conhecimento e da informação", marcada pelos efeitos da globalização dos meios de comunicação de massa, parte-se do princípio de que, por um lado "todas as informações aparecem contextualizadas", mas por outro lado "oferecem a possibilidade de um modo diferente de olhar. Nada mais é estabelecido por si mesmo. Tudo parece estar à mercê da comparação com outras possibilidades" (Luhmann 1997, p. 17). Essa tendência leva à conclusão de que cada pessoa tem de se conscientizar da responsabilidade que tem para consigo e, assim, procurar "encontrar possibilidades de se orientar em si própria sob essas condições" (idem). As mudanças sociais, portanto, levam inevitavelmente a uma crise do paradigma do conhecimento tradicional, tecnocrata e behaviorista, que durante muitos anos dominou mundialmente a construção de planos de ensino e currículos das escolas. Sobre essa questão, vale destacar a interpretação de Therrien (1996, p.129) sobre as mudanças na relação entre trabalho e conhecimento:
    A complexidade de situações nas quais atuam os trabalhadores interativos os exclui das regras programadas e estreitas da tecnologia científica sustentada pela razão instrumental. Estes trabalhadores detêm um espaço de autonomia inerente à sua identidade. A tensão entre a razão instrumental e a razão comunicativa, discursiva, delimita o espaço do trabalhador interativo abrindo portas para a crítica da ciência formulada por alguns pós-modernistas, tais como Lyotard e Habermas. A organização do trabalho interativo não pode, portanto, pautar-se na mesma racionalidade da razão formal.






  3. O caráter marcadamente individualista e mercantil da modernidade moderna propiciaram a instauração de uma dinâmica onde o consumismo e a descartabilidade são os principais protagonistas.
    Autores como Sombart e Bataille, privilegiam uma análise focada no consumo e não na produção, para ressaltar a importância histórica da função social da despesa improdutiva. O vínculo, entre riqueza e despesas improdutivas para a coletividade, foi rompido quando esta última foi colocada sob o crivo exclusivista com a priorização da aquisição e da produção racional utilitarista. O início desse processo se refere a uma época que primava por um estilo de vida luxuoso e hedonista, que adquiriu uma forte conotação mercantil e individualista com a ascensão da burguesia.
    E d
    esde então, se instaurou uma valorização social do consumo, que contemporaneamente moldou uma identidade de modismos descartáveis para o homem moderno, que tem como locus de vida locais protegidos das desigualdades sociais que lhe são associadas – shopping centers, condomínios. Mas a descartabilidade gerada pela propagação desse modo de vida pelo mundo extrapolou os objetos materiais, e acabou atingindo o próprio ser humano. Para suportar o sofrimento de ser reduzido a uma mercadoria descartável, o homem moderno passou a utilizar mecanismos culturais analgésicos - insustentáveis a longo prazo. Um desses mecanismos, a substituição de experiências autênticas pelo consumo de necessidades artificialmente produzidas, transformou o homem em um ser inabilitado frente aos desafios do mundo porque dependente do consumo de serviços especializados e inovações tecnológicas. E o outro mecanismo é a crescente virtualização do real, ou a hegemonia de uma “realidade mediada”, que insensibilizou o homem das injustiças geradas por uma sociedade consumista excludente, através do distanciamento de imagens e de um enorme volume de informações descontextualizadas apresentadas pela mídia e pelos especialistas a seu serviço. Ambos os mecanismos são fornecidos e legitimados pela aliança que se estabeleceu entre the big science, o espetáculo e o mercado para banir a ética da relação dos seres humanos com seus semelhantes e o meio ambiente, instituindo uma visão de mundo e de homem excludente, individualista, consumista e, sobretudo, insensivelmente descartável...






  4. A resposta é sim se comungamos essa angústia, essa frustração frente aos sonhos idílicos da modernidade. Quem diria que a revolução russa terminaria em gulags, a chinesa em capitalismo de Estado e tantos partidos de esquerda assumiriam o poder como o violinista que pega o instrumento com a esquerda e toca com a direita?
    Nenhum sistema filosófico resiste, hoje, à mercantilização da sociedade: a arte virou moda; a moda, improviso; o improviso, esperteza. As transgressões já não são exceções, e sim regras. O avanço da tecnologia, da informatização, da robótica, a gloogletização da cultura, a telecelularização das relações humanas, a banalização da violência, são fatores que nos mergulham em atitudes e formas de pensar pessimistas e provocadoras, anárquicas e conservadoras.
    Na pós-modernidade, o sistemático cede lugar ao fragmentário, o homogêneo ao plural, a teoria ao experimental. A razão delira, fantasia-se de cínica, baila ao ritmo dos jogos de linguagem. Nesse mar revolto, muitos se apegam às “irracionalidades” do passado, à religiosidade sem teologia, à xenofobia, ao consumismo desenfreado, às emoções sem perspectivas.
    Para os pós-modernos a história findou, o lazer se reduz ao hedonismo, a filosofia a um conjunto de perguntas sem respostas. O que importa é a novidade. Já não se percebe a distinção entre urgente e importante, acidental e essencial, valores e oportunidades. A estética se faz esteticismo; importa o adorno, a moldura, e não a profundidade ou o conteúdo. O pós-moderno é refém da exteriorização e dos estereótipos. Para ele, o agora é mais importante que o depois.
    Para o pós-moderno, a razão vira racionalização, já não há pensamento crítico; ele prefere, neste mundo conflitivo, ser espectador e não protagonista, observador e não participante, público e não ator.






  5. Além da coerção e a violência, a sociedade capitalista lança mão de uma ideologia destinada a conseguir a dominação consentida da burguesia sobre as classes subalternas. As sociedades anteriores inscreviam as relações de classe em sua constituição; a sociedade burguesa as escamoteia atrás das idéias do 'bem comum' (Commonwealth), interesse coletivo, liberdade e igualdade (apoiada na igualdade formal) entre os indivíduos da sociedade que então são induzidos ao comportamento racional. A forma política precípua da sociedade burguesa é a democracia, que em épocas de crise e fallhas no domínio da ideologia pode se transformar em ditadura.

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